Newsletters

A taxa pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas

17 Maio 2023
A taxa pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas
Newsletters

A taxa pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas

17 Maio 2023

SUMÁRIO

A taxa pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas veio a ser considerada inconstitucional pelo Tribunal Central Administrativo Sul no Acórdão n.º 966/12.8BELRS de 24 de novembro de 2022, em razão desta ser considerar uma contribuição financeira devendo os seus elementos ser definidos por lei e não por mero regulamento administrativo.

BREVE ENQUADRAMENTO

No âmbito do processo que deu origem aos autos do Acórdão n.º 966/12.8BELRS, esteve uma Impugnação Judicial que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa, que teve por objeto a liquidação da taxa anual devida pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas, referente ao ano de 2011.

Em sede de Impugnação Judicial foi alegada a inconstitucionalidade do tributo em causa, designadamente do ponto de vista da violação do princípio da legalidade nas suas duas vertentes (tipicidade e reserva de lei parlamentar).

A DECISÃO DO TRIBUNAL

Nos termos do disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”), “[n]os feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”.

Nesse sentido, e centrandonos especificamente na Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa ao quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (“diretiva quadro”), a alínea b) do n.º 1 do artigo 105.º da Lei de Comunicações Eletrónicas (“LCE”), Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro), consagrava que o “exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas” está sujeito a taxas de periodicidade anual.”.

Por outro lado, o n.º 4 do mesmo artigo 105.º referia que os montantes são determinados em função dos custos administrativos, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 105.º da LCE (também por referência à Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro).

Era tido desde logo em conta o valor dos “proveitos [atualmente rendimentos] relevantes” diretamente conexos com a atividade de comunicações eletrónicas relativa ao ano anterior àquele em que era efetuada a liquidação do tributo, sendo cada entidade enquadrada em um dos três escalões definidos, de acordo com tais valores.

Concetualmente, no que respeita às taxas as mesmas configuravam-se como prestações pecuniárias impostas coativa ou autoritariamente, pelo Estado ou outro ente público, sem que tivessem caráter sancionatório, pressupondo a existência de uma contraprestação, fosse uma prestação de um serviço público, a utilização de um bem do domínio público ou a remoção de um obstáculo jurídico.

A par das taxas e dos impostos surge a terceira categoria, a das contribuições financeiras, classificação de caráter residual, abrangendo os tributos que não são nem impostos nem taxas.

No caso específico desta taxa, no que respeita, em especial, à parte em que é determinada a incidência objetiva e a taxa a aplicar em relação aos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas, enquadrados no «escalão 2», que é o caso nos autos, é a Portaria que cria escalões, que define o universo de sujeitos passivos que integram o «escalão 2» e que elege como critério determinante da repartição dos custos a compensar os rendimentos relevantes diretamente conexos com a atividade de serviços de comunicações eletrónicas, apurados no ano anterior àquele a que a taxa se reporta, do qual resulta a taxa concretamente aplicada aos operadores enquadrados neste escalão.

Posto isto, resulta do anteriormente exposto que, o Tribunal se viu obrigado a reconhecer que certos elementos da impugnada taxa de regulação, determinantes da quantificação do tributo, foram objeto de normação primária por via regulamentar, ou seja, através do exercício da função administrativa.

Sucede que, o douto Tribunal acompanhou e acolheu esses elementos, seguindo o entendimento do Tribunal Constitucional, que expôs que, «integram a reserva de função legislativa, re-serva essa, cujo desiderato, na ausência de um regime geral das contribuições financeiras constante de lei parlamentar ou decreto-lei devidamente autorizado, é o de assegurar um certo nível de coerência, transparência, equidade e legitimidade na criação desses tributos. (…)».

Ora, as normas constantes dos n.ºs 1, 4 e 5 do Anexo II da Portaria n.º 1473-B/2008, de 17 de Dezembro, na redação da Portaria n.º 291-A/2011, de 04 de novembro, ao regularem de forma inovatória elementos essenciais da taxa a aplicar em relação aos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas enquadrados no «escalão 2», violam essa reserva de função legislativa que se pode extrair das disposições conjugadas da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º e do n.º 2 do artigo 266.º da Constituição.

O Tribunal considerou assim que estamos perante uma contribuição financeira, cujas normas, designadamente de incidência objetiva e taxa a aplicar em relação aos fornecedores de redes e serviços de comunicações eletrónicas, concretamente do escalão 2, aqui em causa, constam não de ato legislativo (cfr. art.º 112.º, n.º 1, da CRP), mas de diploma regulamentar, infra legislativo.

O Tribunal Central Administrativo Sul pronunciou-se, assim, no Acórdão n.º 966/12.8BELRS, de 24 de novembro de 2022 pela inconstitucionalidade orgânica da «taxa anual devida pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas» por violação das disposições conjugadas da alínea i) do n.º 1 do art.º 165.º e do n.º 2 do art.º 266.º da CRP.

CONCLUSÕES

Em face da análise do Tribunal supra exposta, a taxa anual devida pelo exercício da atividade de fornecedor de redes e serviços de comunicações eletrónicas tem natureza de contribuição financeira.

Consequentemente, o Tribunal Central Administrativo Sul negou provimento ao recurso e julgou a taxa a aplicar em relação aos fornecedores de redes e de comunicações eletrónicas enquadrados no “escalão 2” como padecendo de inconstitucionalidade orgânica, por violação das disposições conjugadas da alínea i) do n.º 1 do art.º 165.º e do n.º 2 do art.º 266.º da CRP.

Por fim, realça-se que a Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro foi revogada, passando a Lei das Comunicações Eletrónicas a ser regulada pela Lei n.º 16/2022, de 16 de agosto.

No entanto, a nova LCE mantém substancialmente a regulamentação anterior, não introduzindo alterações profundas em matéria de taxas relativamente ao que se encontrava previsto na anterior Lei das Comunicações Eletrónicas.

A taxa anual devida pelas empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas abrangidas pelo regime de autorização geral, comummente designada taxa de regulação passa a cons-tar agora do artigo 167.º da nova LCE.

***

Lisboa, 17 de maio de 2023

Rogério Fernandes Ferreira
Vânia Codeço
João Mário Costa
Rita Sousa
José Pedro Barros
Carolina Mendes
Patrícia Duarte
Álvaro Marques
Inês Reigoto

(Tax litigation team)

Know-How