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A proposta da comissão europeia para atualização da Diretiva Administrativa de Cooperação (DAC 8)

21 février 2023
A proposta da comissão europeia para atualização da Diretiva Administrativa de Cooperação (DAC 8)
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A proposta da comissão europeia para atualização da Diretiva Administrativa de Cooperação (DAC 8)

21 février 2023

SUMÁRIO

A 8 de Dezembro de 2022, a Comissão Europeia (doravante designada “Comissão”) publicou uma proposta legislativa de revisão da Diretiva 2011/16/UE do Conselho (doravante designada por “DAC”), propondo a inclusão de outras categorias de rendimentos e ativos, tais como os  criptoativos, tal como também definidos na proposta de Regulamento sobre o Mercado de Criptoativos (“MiCA”) no âmbito do intercâmbio automático de informações (“AEOI”).

A Diretiva em questão conta já com diversas alterações, sendo esta é a 8ª alteração, razão pelo a qual a presente proposta ficou conhecida por DAC 8.

DA PROPOSTA DA DAC 8 À TRANSFORMAÇÃO DA DAC DESDE OS SEUS PRIMÓRDIOS

A 8 de dezembro de 2022, a Comissão Europeia publicou a proposta de revisão da Diretiva sobre cooperação administrativa (Diretiva do Concelho 2011/16 UE ou DAC) para implementar as regras da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) sobre a elaboração de relatórios relativos a criptoativos e e-money.

Em súmula, as regras exigem que as instituições que oferecem serviços relativos a criptoativos ou serviços de e-money aos clientes na União Europeia (UE) apresentem relatórios dos quais constem as informações relevantes no que concerne à tipologia de ativo, ao seu transmitente e ao seu adquirente, sendo que, em alguns casos a obrigação de reporte abrangerá também os tokens digitais, mais concretamente, os NFTs (“non-fungible items”).

A proposta está desenhada para ser implementada nos países da União em 2026, sendo este, o primeiro ano para apresentar os relatórios consagrados por esta atualização da Diretiva.

As regras propostas contêm também atualizações das regras de troca automática de informação entre Administrações fiscais já existentes, incluindo o estabelecimento de sanções mínimas por incumprimento em todos os aspetos da troca automática de informação e disposições destinadas a indivíduos com elevado património.

A proposta inclui ainda, tal como também definidos na proposta de Regulamento sobre o Mercado de Ativos Criptográficos (MiCA) e no âmbito do intercâmbio automático de informações (AEOI), o conceito de criptoativos, bem como, o conceito de operadores económicos de criptoativos (“Crypto operators”).

Notamos que, na génese da criação da DAC encontramos o fundamento desta diretiva, sendo que, aquando da sua criação o objetivo primordial seria a cooperação entre administrações fiscais e a troca de informações relativos a rendimento de trabalho, rendimentos de pensões e outros tipos de pagamentos.

Ora, desde a sua criação até ao momento, a DAC tem vindo a ser atualizada tendo em consideração os rendimentos contemporâneos, bem como a maior automatização da comunicação e troca de informações sobre diversos assuntos fiscais.

Reiteramos a importância da DAC 2, na qual se instituiu o “Common Reporting Standard” como o objetivo de padronizar os relatórios de bancos, entidades de investimento, seguradoras e entidades gestoras de património.

Relativamente à DAC 3, encontramos a criação da obrigatoriedade de comunicações e trocas de informações entre Administrações Fiscais Europeias.

A criação da DAC 6 veio impor o “Mandatory Disclosure Regime” com o objetivo de impor a todos os profissionais intermediários fiscais, como por exemplo, contabilistas e consultores fiscais, a obrigação de comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira, de determinados mecanismos internos ou transfronteiriços com relevância fiscal.

Por último, a DAC 7 veio abranger as plataformas digitais destinadas a venda de bens, alojamento e transporte.

O ALARGAMENTO DO ÂMBITO DA DIRETIVA: A DAC 8

Aqui chegados, importa agora perceber os contornos da DAC 8 que tem como objetivo principal incluir os rendimentos decorrentes de criptoativos, bem como e-money, no corpo desta Diretiva.

Numa primeira impressão, afigura-se razoável dizer que a DAC 8 visa promover o reporte e troca de informações entre países, relativamente aos criptoativos para efeitos de tributação direta dos seus detentores.

Na prática, a proposta promove a possibilidade de os Estados-Membros detetarem situações de fraude fiscal, evasão fiscal ou abuso fiscal.

Efetivamente, a alteração da Diretiva requer o reporte dos criptoativos, dos sujeitos seus detentores e dos seus intermediários, por forma a reportar as transações realizadas por clientes que residam na União Europeia.

A proposta cobre as transações domésticas, bem como as transnacionais que possam ocorrer.

A DAC 8 visa ainda o controlo da moeda eletrónica, em concreto, do e-money, pelo que vem impor o reporte por parte das instituições financeiras do reporte das moedas digitais e dos seus bancos digitais.

Conforme veremos adiante, a DAC 8 visa também a integração de um conjunto de normas e obrigações de reporte e comunicação referentes aos indivíduos com elevado património residentes na União Europeia.

OBJETIVOS E PERSPETIVAS

No que concerne aos objetivos gerais, a DAC 8 visa promover:

  • O bom funcionamento dos mercados internos;
  • A redução da evasão fiscal e outras formas de abuso;
  • A simplificação das regras de compliance numa linha padronizada da na EU;
  • O aumento da confiança por parte dos cidadãos da EU nas suas Administrações Fiscais.

Por ora, na linha de objetivos específicos a Comissão visa permitir às Administrações Fiscais a obtenção de informações necessárias, à cooperação entre Administrações Fiscais, a manutenção dos custos associados ao compliance através do “European Common Report Standard” e, ainda, a expansão da troca de informação relativas às transações realizadas com criptoativos, bem como, com outros ativos reconhecidos como e-money.

A DAC 8 procura, assim, estabelecer uma maior transparência e efetividade a esta Diretiva seguindo, portanto, a linha de alterações que tem sido preconizada por forma a estreitar as relações entre Administrações Fiscais europeias com cada vez maior transparência e atualização adaptada à evolução dos tipos de rendimento.

Numa última nota, é relevante realçar que a DAC 8 pretende introduzir os conceitos de criptoativos e e-money nesta Diretiva de Cooperação Administrativa.

O ALINHAMENTO COM O CARF – “CRYPTO-ASSETS REPORTING FRAMEWORK” E A MICA – “MARKET IN CRYPTO-ASSETS”

A proposta legislativa para a DAC 8 segue substancialmente os termos já propostos pelo CARF – Enquadramento para o Reporte de Rendimentos decorrentes de Criptoativos - publicado pela OCDE.

Nessa mesma linha, a DAC 8 preocupa--se também em estabelecer conceitos uniformes com a MiCA – Regulamento sobre o Mercado de Ativos Criptográficos, utilizando as mesmas definições no que concerne aos prestadores de serviços, aos criptoativos, e aos serviços a estes associados.

A EXTENSÃO DA COMUNICAÇÃO RELATIVA AOS “HNWI” (HIGH NET WORTH INDIVIDUALS)

A proposta de elaboração da DAC 8 vem definir os contornos de trocas de informação relativas aos indivíduos com elevado valor patrimonial, os quais, fica estabelecido que assim serão considerados os indivíduos com pelo menos 1 milhão de euros de riqueza financeira ou investida.

Verifica-se, portanto, o alargamento do escopo da DAC que deixa de abranger apenas estruturas societárias e empresariais, para passar a incluir no seu escopo, também, os indivíduos com elevado valor patrimonial.

Note-se que, para o cômputo da riqueza do contribuinte, será descontado o valor referente à habitação própria do mesmo.

O FUTURO DA PROPOSTA DAC 8

A proposta da Comissão encontra-se, atualmente, em consulta até Fevereiro de 2023, exigindo-se, assim,  a consulta do Parlamento Europeu e o acordo unânime de todos os 27 Estados-Membros da UE no Conselho.

Após a adoção formal da DAC 8 pelo Conselho, os Estados-Membros terão até 31 de Dezembro de 2025 para transporem as principais regras para o direito nacional.

As novas disposições serão aplicáveis a partir de 1 de Janeiro de 2026.

Neste âmbito, surge a aplicação de duas exceções, sendo elas:

  •  as disposições relativas aos serviços de identificação que, deverão ser transpostas para o direito nacional de cada Estado-membro até 1 de Janeiro de 2024 e, desse mesmo modo, devem ser aplicáveis a partir de 1 de Janeiro de 2025; e ainda,
  •  as disposições relativas à validação do NIF que, deverão ser transpostas para o direito nacional até 31 de Dezembro de 2027 e aplicáveis a partir de 1 de Janeiro de 2028 em cada Estado-membro da União.

CONCLUSÃO

As alterações propostas sublinham a intenção da União Europeia de encarar os desafios que surgem no âmbito da crescente utilização de criptoativos para fins de investimento.

Esta proposta visa aumentar a transparência fiscal sobre os criptoativos que são detidos em bolsas e outros serviços associados que se encontrem na UE, ou que  sejam detidos por residentes dessa mesma jurisdição.

Entendemos que o objetivo da União é, em primeira linha, o de padronização de conceitos tornando-os transversais e unânimes ao nível da União e ainda, a sistematização e estandardização dos sistemas de controlo dos rendimentos provenientes de criptoativos e e-money.

Verificamos, ainda, a expansão do reporte e troca de informações entre Autoridades Tributárias, dentro da União Europeia, por forma a cobrir os rendimentos gerados por utilizadores e/ou operadores de criptoativos.

Promove-se, também, a densificação do controlo dos indivíduos com elevado valor patrimonial e as normas a estes aplicáveis no que concerne às trocas de informações entre Administrações Fiscais.

Com efeito, torna-se relevante que os detentores deste tipo de ativos façam uma análise prévia dos rendimentos que visam obter neste âmbito, bem como, dos desafios que esta transformação introduzida pela Diretiva poderá comportar para os mesmos.

Reforçamos que, até ao momento, foi somente disponibilizada a proposta de alteração da Diretiva e que a implementação das regras, que aqui se analisam, deverá ocorrer, somente, a partir de 1 de janeiro de 2026, sem prejuízo das exceções já acima elencadas.

Regressaremos com novidades e atualizações assim que o objeto de proposta se formalize e o seu quadro legal se efetive, por forma a ser transposta pelos Estados da União.

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Lisboa, 21 de fevereiro de 2023

Rogério M. Fernandes Ferreira
Duarte Ornelas Monteiro
Joana Marques Alves
Ricardo Miguel Martins
Marta Cabugueira Leal
João Rebelo Maltez
Bárbara Teixeira Neves
Raquel Silva Simões 

Private Clients Team

Com a colaboração de:
Rosa Freitas Soares, Senior Advisor da RFF

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