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Programa Mais Habitação (2/4): Propostas relativas à tributação do rendimento

14 Março 2023
Programa Mais Habitação (2/4): Propostas relativas à tributação do rendimento
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Programa Mais Habitação (2/4): Propostas relativas à tributação do rendimento

14 Março 2023

SUMÁRIO

O Projeto de Proposta de Lei n.º PL 64/XXIII/2023, de 03 de março de 2023, também conhecido por Pacote “Mais Habitação” veio estabelecer um conjunto de medidas, com impacto, entre outras matérias, nos regimes vigentes com referência à tributação sobre o rendimento.

No âmbito do Pacote de medidas “Mais Habitação”, o Governo deu a conhecer o Projeto de Proposta de Lei (“PPL”) onde constam medidas, concretas, que, entre outros aspetos, visam a alteração de regimes vigentes em matéria de tributação do rendimento, nomeadamente no que respeita à tributação das mais-valias imobiliárias, dos rendimentos prediais e no âmbito do regime do Alojamento Local.

MAIS VALIAS IMOBILIÁRIAS E REINVESTIMENTO

No âmbito das medidas divulgadas, propõe-se a modificação do regime de exclusão de tributação de mais-valias imobiliárias provenientes de Habitação Própria e Permanente (“HPP”) e reinvestidas também em HPP.

Assim, propõe-se a inclusão dos seguintes requisitos aos já previstos para beneficiar da referida exclusão de tributação:

  •  imóvel alienado ter sido destinado à HPP do sujeito passivo ou do seu agregado familiar pelo menos nos 24 meses anteriores à data da transmissão; e,
  • os sujeitos passivos não terem beneficiado anteriormente do regime de exclusão de tributação de mais-valias imobiliárias, no ano da obtenção dos ganhos, nem nos três anos anteriores, sem prejuízo do sujeito passivo poder comprovar que a não observância deste requisito se deveu a situação excecional.

Adicionalmente, propõe-se o aditamento de mais um requisito para efeitos da não aplicação do regime de exclusão de tributação de mais-valias imobiliárias e que se traduz no da fixação do domicílio fiscal do sujeito passivo ou do seu agregado familiar no imóvel.

MAIS VALIAS IMOBILIÁRIAS NORMA TRANSITÓRIA

É proposta a consagração de uma norma transitória, nos termos da qual são excluídos de tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis quando, cumulativamente, se verifiquem as seguintes condições:

  • o imóvel não seja destinado a HPP do sujeito passivo ou do seu agregado familiar;
  • o valor de realização, deduzido da amortização de empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, seja aplicado na amortização do capital em dívida em crédito à habitação destinado a HPP do sujeito passivo ou dos seus descendentes; e
  • a referida amortização seja concretizada no prazo de três meses contados da data da alienação.

Nos termos da mesma norma transitória, sempre que o saldo apurado, em resultado da alienação, for superior ao capital em dívida no crédito à habitação destinado a HPP do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, o valor remanescente será sujeito a tributação de acordo com as disposições gerais previstas no Código do IRS.

Neste cenário, pretende-se ainda que a Administração tributária possa vir a exigir a apresentação de documentos, após a entrega da declaração modelo 3 de IRS de 2023 e 2024, comprovativos da amortização do capital em dívida em crédito à habitação destinado à HPP.

MAIS VALIAS IMOBILIÁRIAS E ALIENAÇÃO DE IMOVEIS AO ESTADO

É, também, proposta uma isenção de tributação, em sede do IRS, aplicável às mais-valias decorrentes da alienação, ao Estado ou às autarquias locais, de imóveis para habitação, com exceção das mais-valias auferidas por residentes com domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

RENDIMENTOS PREDIAIS

Ainda no âmbito das propostas que se pretendem apresentar para alteração ao Código do IRS, em concreto, em matéria de tributação dos rendimentos prediais, propõe-se uma diminuição da taxa autónoma e liberatória aplicável a estes rendimentos, de 28% para 25%.

Adicionalmente, propõe-se uma alteração às taxas reduzidas a aplicar aos rendimentos provenientes de contratos de arrendamento de longa duração, os quais passarão a ser elegíveis a tal redução apenas a partir de uma duração igual ou superior a cinco anos, (ao invés do regime atual, que é aplicável a contratos de arrendamento com uma duração de, pelo menos, dois anos).

Assim, propõe-se (i) uma diminuição referida taxa autónoma em 10 pontos percentuais para contratos com duração entre 5 e 10 anos, (ii) uma diminuição de 15 pontos percentuais quando o contrato tenha duração entre 10 a 20 anos e, por último, (iii) uma redução de 20 pontos percentuais para contratos de duração igual ou superior a 20 anos.

RENDIMENTOS PREDIAIS NOS CONTRATOS ANTERIORES A 1990

Em matéria de contratos de arrendamento, propõe-se, também, uma isenção, em sede do IRS, aplicável durante o período de duração dos respetivos contratos, com referência aos rendimentos prediais obtidos no âmbito de contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do RAU em 1990.

RENDIMENTOS PREDIAIS NA TRANSFERÊNCIA DE ALOJAMENTO LOCAL PARA ARRENDAMENTO

Propõe-se, também, a consagração de uma isenção, de IRS e IRC, aplicável aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento afetos a HPP, desde que verificadas as seguintes condições:

  • o contrato de arrendamento resulte da transferência de imóveis anteriormente afetos à exploração de estabelecimentos de Alojamento Local para arrendamento para habitação permanente;
  • o registo do estabelecimento de Alojamento Local tenha ocorrido até 31 de dezembro de 2022;
  • a celebração do contrato de arrendamento e respetivo registo junto da Administração tributária ocorra até 31 de dezembro de 2024.

Note-se, todavia, que a isenção que agora se propõe irá operar apenas até 31 de de-zembro de 2030.

A NOVA CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA SOBRE ESTABELECIMENTOS DE ALOJAMENTO LOCAL

Ainda no âmbito das medidas de combate à crise na habitação, propõe-se a criação de uma nova contribuição extraordinária, agora sobre os estabelecimentos de Alojamento Local (CEAL).

Em concreto, prevê-se que venha a ser aplicada uma taxa, de 35%, a uma base tributável que será determinada por dois coeficientes: (i) o “coeficiente económico” e o “coeficiente de pressão urbanística”.

Estes coeficientes, por sua vez, assentam em valores de referência e em médias publicadas anualmente, em função da localização do imóvel e área do mesmo (ao invés de dependerem do rendimento efetivamente obtido no âmbito do Alojamento Local).

Tal pretensão implicará, mesmo numa situação em que, num determinado ano, as despesas suportadas pelo sujeito passivo, neste tipo de atividade, sejam superiores ao rendimento obtido, ou mesmo num ano em que não exista rendimento, o Alojamento Local, na pessoa do titular da licença ou, subsidiariamente, no proprietário do imóvel, implicará o pagamento desta contribuição extraordinária.

Tal significa que os proprietários de imóveis nos quais se desenvolva a atividade de Alojamento Local, ainda que não sejam os titulares da licença para exploração dessa atividade, serão também subsidiariamente responsáveis pela liquidação e pelo pagamento desta CEAL relativamente aos mesmos.

A nova CEAL, por sua vez, aplicar-se-á em relação aos imóveis habitacionais localizados em zona de pressão urbanística, aferidos a 31 de dezembro de cada ano civil, sendo, conforme referido, a sua base tributável definida pela aplicação do coeficiente económico e de um coeficiente de pressão urbanística.

Tal como sucede com a maioria das contribuições sobre outros sectores económicos específicos, às quais geralmente são apontadas críticas relacionadas com o desrespeito pela reserva de lei ou da igualdade, ou de outras regras legais, financeiras e orçamentais que lhes pode ser assacada, a CEAL não irá fugir, tudo indica, a alguns desses vícios. Mas não fugirá, também, certamente a outras críticas.

Por outro lado, não existe uma delimitação temporal concreta para a aplicação desta contribuição extraordinária, presumindo-se que a sua vigência perdure até que o objetivo final seja alcançado e, porventura mais relevante, suscita desde já problemas de natureza vária à luz da nossa Constituição, nomeadamente quanto à existência de rendimentos presumidos, ao princípio da capacidade contributiva e quanto à existência de dois impostos sobre o ren-dimento pessoal, o que a Constituição não admite.

Dá-se ainda nota que os coeficientes indicados para o cálculo desta CEAL por referência ao ano de 2023, e a ser liquidada em 2024, deverão seguir médias e critérios por referência ao ano de 2019, ou seja, um ano pré-pandemia e que pouco ou nada reflete o atual estado do mercado habitacional, o que, por si só, pode também suscitar questões de retroatividade da lei fiscal, ou de violação do princípio da confiança, o que a nossa Constituição não deverá também admitir.

CONCLUSÕES

Estando as medidas propostas, no âmbito do “Mais Habitação”, em consulta pública, a redação final do Projeto de Proposta de Lei ainda poderá sofrer alterações, mas as já propostas são alterações muito relevantes em relação à situação atual.

Neste sentido, acompanharemos as conclusões da consulta pública e a aprovação do Projeto de Proposta de Lei em Conselho de Ministros, o que nos permitirá aferir da manutenção das medidas até ao momento apresentadas.

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Lisboa, 14 de março de 2023

Rogério M. Fernandes Ferreira
Duarte Ornelas Monteiro
Joana Marques Alves
Ricardo Miguel Martins
Marta Cabugueira Leal
João Rebelo Maltez
Bárbara Teixeira Neves
Raquel Silva Simões

(Private Clients Team)

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