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O SIFIDE nas sociedades transparentes (v.g. sociedade de advogados)

14 Outubro 2022
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O SIFIDE nas sociedades transparentes (v.g. sociedade de advogados)

14 Outubro 2022

SUMÁRIO

O Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) proferiu a decisão arbitral n.º 93/2022-T, relativamente à dedução à coleta de despesas de investigação e de desenvolvimento elegíveis no âmbito do Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE II), quando haja lugar à imputação da matéria tributável aos sócios de sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal.

ENQUADRAMENTO

No passado dia 26 de setembro de 2022, o CAAD proferiu decisão arbitral no âmbito do processo n.º 93/2022-T e que opunha os sócios de uma sociedade de advogados (Requerentes), sujeita ao regime de transparência fiscal, à Administração tributária (Requerida).

No essencial, discutiu-se a possibilidade de deduzir à coleta de IRS (isto é, ao valor de imposto a pagar), as despesas de investigação e de desenvolvimento elegíveis no âmbito do Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE II), quando haja lugar à imputação da matéria tributável aos sócios de sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal.

A POSIÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA

Tanto quanto resulta da posição sustentada pela Administração tributária, e embora seja reconhecido que as despesas realizadas pelos Requerentes em 2019 são suscetíveis de integrar “despesas de investigação e desenvolvimento”, a Administração tributária considera que os valores a deduzir, independentemente do correspondente montante, não podem exceder o limite de € 1.000 imposto pelo Código de IRS, prejudicando, assim, a aplicação do benefício fiscal na esfera dos sócios, atenta à situação de transparência fiscal existente.

A POSIÇÃO DOS REQUERENTES

Os Requerentes, por seu turno, alegaram que não foram considerados os valores que teriam direito a deduzir à coleta, em virtude do investimento no SIFIDE II, considerando que as deduções à coleta no âmbito das sociedades sujeitas ao regime da transparência fiscal devem ser determinadas de acordo com as regras do Código do IRC, isto é, imputadas aos respetivos sócios e deduzidas ao montante apurado com base na matéria coletável da entidade transparente.

Entendem os requerentes que o referido limite previsto no Código de IRS, e invocado pela Administração tributária, não deve relevar, uma vez que, este se refere, única e exclusivamente, às deduções à coleta aplicáveis a sujeitos passivos em sede de IRS.

Acresce ainda, no entender dos Requerentes, que os limites da dedução à coleta previstos no Código do IRS têm em conta a situação pessoal das pessoas singulares e não das pessoas coletivas.

O TEOR DA DECISAO ARBITRAL

Para o Tribunal Arbitral, a questão de fundo foi a saber se a dedução à coleta de despesas de investigação e de desenvolvimento, elegíveis no âmbito do SIFIDE II, se encontra sujeita ao limite estabelecido no Código do IRS, que prevê um montante de € 1.000, quando haja lugar à imputação da matéria coletável no rendimento tributável dos sócios de sociedades profissionais, no âmbito do regime de transparência fiscal.

No entendimento do Tribunal Arbitral, ainda que o rendimento dos sócios da sociedade, sujeita a transparência fiscal, seja tributado na sua esfera jurídica, em sede de IRS, a matéria coletável é determinada nos termos do Código do IRC, que regula, não só os termos em que se processa a liquidação, com base na obrigação declarativa do sujeito passivo, como especifica as deduções que podem ser efetuadas ao montante apurado, aí se incluindo as relativas a benefícios fiscais.

Em paralelo, acrescenta ainda o Tribunal Arbitral que as deduções à coleta respeitantes a entidades a que seja aplicável o regime de transparência fiscal “são imputadas aos respetivos sócios ou membros (…) e deduzidas ao montante apurado com base na matéria coletável que tenha tido em consideração a imputação prevista no mesmo artigo”.

Ainda em conformidade com o entendimento do Tribunal Arbitral, o próprio Código Fiscal do Investimento (CFI) esclarece que o valor correspondente às despesas pode ser deduzido ao montante da coleta do IRC, apurado nos termos do Código do IRC.

Em face do exposto, considera o CAAD que as deduções à coleta, no âmbito do regime de transparência fiscal, são efetuadas nos termos do Código do IRC, não tendo aplicação ao caso o regime de deduções à coleta em IRS.

A DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDA

Não obstante a decisão arbitral proferida, a Árbitra Vogal votou vencido, considerando que deveria ter sido aplicado o limite estabelecido no Código de IRS.

De facto, no seu entender, o SIFIDE II consiste numa dedução à coleta, operando, pois, num momento já ulterior ao do apuramento da matéria coletável, em conformidade com o CFI: “(...) podem deduzir ao montante da coleta de IRC apurado nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência, (...)”.

Nesta medida, e tomando em consideração que se encontra em análise uma sociedade sujeita ao regime de transparência fiscal, as deduções à coleta resultam da imputação determinada pelo Código de IRC.

Em paralelo, é igualmente salientado que, em conformidade com o Código de IRC, “As sociedades e outras entidades a que, (…), seja aplicável o regime de transparência fiscal não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas.

A matéria coletável deve ser, no seu entender, apurada nos termos do (artigo 15.º, n.º 1) Código de IRC, e não, contrariamente ao que se entende na posição que fez vencimento, nos termos do (artigo 90.º) referido Código.

E, assim, por tudo, nas deduções à coleta no âmbito do regime de transparência fiscal, quando de sócios pessoas singulares se trate, tem, necessariamente, em sua opinião, aplicação o limite estabelecido no (artigo 78.º, n.º 7 e 8) Código de IRS.

No entender da mesma Árbitra, encontra-se a ser utilizada a personalidade jurídica da sociedade em regime de transparência fiscal para se adquirir um direito a um benefício fiscal e que, de outro modo, não poderia ser adquirido, na medida em que o mesmo vem previsto em sede de IRC, e não em sede de IRS.

OBSERVAÇÕES FINAIS

Não obstante o teor do voto de vencido, parece-nos que o sentido da presente decisão arbitral contribui para clarificar que os sócios de entidades sujeitas ao regime de transparência fiscal, como é o caso das sociedades de advogados, podem beneficiar da dedução à coleta de benefícios fiscais (SIFIDE ), sem atender às limitações referentes às deduções à coleta em sede de IRS.

Este é o entendimento, aliás, que é convergente com a doutrina Administrativa existente a respeito de outros benefícios fiscais.

Lisboa, 14 de outubro de 2022

Rogério M. Fernandes Ferreira
Marta Machado de Almeida
Álvaro Silveira de Meneses
Miriam Campos Dionísio
João de Freitas Jacob

(Tax Advisory Team)

www.rffadvogados.pt

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