A Administração Tributária sancionou um novo entendimento, nos termos do qual, no caso das locações, os ativos sob direito de uso são amortizados em função de o prazo da locação ser inferior ou superior ao período de vida útil do bem.
ENQUADRAMENTO
Na sequência de inúmeras dúvidas, e até de críticas, ao teor da Circular n.º 7/2020, de 13 de agosto, em especial do seu ponto 9, referente às taxas de amortização a serem aplicadas aos ativos sob direito de uso em contratos de locação e que criava divergências relevantes entre a contabilidade e a fiscalidade (designadamente nas situações em que os ativos subjacentes têm um período de vida útil superior ao prazo da locação), foi, por Despacho n.º 70/2024-XXIII, de 21 de fevereiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, sancionado um novo entendimento, na recente Circular 3/2024, de 1 de março.
O ENTENDIMENTO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA
Não se encontrando previstas taxas de amortização para os ativos sob direito de uso nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro e orientada pelo princípio de utilidade económica do funcionamento dos bens, a Administração tributária sancionou um novo entendimento, nos termos do qual, no caso das locações, os ativos sob direito de uso são amortizados em função de o prazo da locação ser inferior ou superior ao período de vida útil do bem.
Assim, caso a locação transfira a propriedade do ativo subjacente para o locatário no fim do prazo da locação, ou o custo do ativo sob direito de uso reflita o facto de o locatário ir exercer uma opção de compra, desde a data de entrada em vigor da locação até ao fim da vida útil do ativo subjacente que resulte das taxas de depreciação/amortização previstas nas tabelas I e II anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009 para esse ativo subjacente, deve atender-se às regras fiscais de depreciação/amortização inerentes ao mesmo.
Por seu turno, caso a locação não transfira a propriedade do ativo subjacente para o locatário no fim do prazo da locação, nem o custo do ativo sob direito de uso reflita o facto de o locatário ir exercer uma opção de compra, desde a data de entrada em vigor da locação até à data de termo da vida útil do ativo sob direito de uso, ou até ao final do prazo da locação, caso este seja anterior (naturalmente, sem prejuízo de se atender às limitações fiscais aplicáveis às viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, quando esse seja o ativo subjacente).
Pese embora esta alteração de entendimento da Administração Tributária e a consequente revogação do anterior ponto 9 da Circular n.º 7/2020, de 13 de agosto, tenha efeitos imediatos, a partir de 1 de março de 2024, a Administração tributária recorda que, na sequência deste novo entendimento, os sujeitos passivos poderão apresentar declaração de substituição, contando-se o prazo para a apresentação da referida declaração desde a data da publicação da alteração em causa no Portal das Finanças.
Indica a Administração tributária que os sujeitos passivos podem, ainda, apresentar Reclamação Graciosa, contando-se o prazo, de 2 anos, igualmente, a partir da data da publicação da Circular n.º 3/2024 no Portal das Finanças.
A Administração tributária abre, também, a possibilidade de se suscitar o Pedido de Revisão Oficiosa de Ato Tributário relativamente à autoliquidação de IRC que tenha seguido o entendimento anterior, na parte agora alterada, admitindo tratar-se de um verdadeiro “erro imputável aos serviços”. Amplia, assim, por mais 2 anos, o prazo para contestar o IRC apurado com base no anterior entendimento, não obstante, desde a Lei do Orçamento de Estado para 2016, ter deixado de existir a presunção legal de “erro imputável aos serviços” nas autoliquidações e, como tal, a impossibilidade de deitar mão do Pedido de Revisão Oficiosa para contestar autoliquidações após o prazo da “reclamação administrativa” (pelo que vem abrir uma exceção contra lei expressa, que é de admissibilidade duvidosa).
Finalmente, a Administração Tributária reconhece que este novo entendimento deve ser aplicável aos procedimentos pendentes de decisão, como sejam, entre outros, as reclamações graciosas, os recursos hierárquicos ou as impugnações judiciais.
CONCLUSÃO
O novo entendimento da Administração Tributária vem aproximar a contabilidade da fiscalidade, facilitando, acreditamos, o tratamento fiscal a conferir às amortizações de ativos em regime de locação, em sede de preenchimento da Declaração de Rendimentos dos sujeitos passivos de IRC. Prevê-se, numa primeira fase, contudo, um aumento exponencial do contencioso e que se espera se fique pela fase administrativa/graciosa, tendo em conta as instruções expressas nesta Circular 3/2024 e que vinculam os serviços da Administração tributária.
***
Rogério Fernandes Ferreira
Vânia Codeço
José Pedro Barros
Álvaro Pinto Marques
Mariana Baptista de Freitas
Bárbara Malheiro Ferreira
Alice Ferraz de Andrade
Raquel Tomé Castelo