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As alterações mais recentes na jurisdição administrativa e tributária

25 mai 2023
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25 mai 2023

SUMÁRIO

A Proposta de Lei n.º 75/XV/1, aprovada em Conselho de Ministros de 13 de abril de 2023, pretende implementar melhorias, tais como a capacidade de resposta dos tribunais administrativos e fiscais, e otimizar o seu funcionamento, através de um conjunto de alterações a vários diplomas estruturantes da jurisdição, as quais foram, algumas, já concretizadas, no Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de maio.

INTRODUÇÃO

No seguimento da Proposta de Lei n.º 75/XV/1, aprovada em Conselho de Ministros de 13 de abril de 2023, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de maio, que determina a autonomia administrativa e financeira do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e define a organização dos seus serviços, com o objetivo claro que aumentar a capacidade de resposta da jurisdição administrativa e tributária.

O ÂMBITO DA PROPOSTA

A Proposta de Lei n.º 75/XV/1, aprovada em Conselho de Ministros de 13 de abril de 2023, pretendeu implementar algumas melhorias, tais como, na capacidade de resposta dos tribunais administrativos e fiscais, e otimizar o seu funcionamento, através de um conjunto de alterações a vários diplomas estruturantes da jurisdição.

Previu alterações ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), ao Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), ao Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) e, ainda, ao Decreto-Lei n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, relativa às normas de competência dos tribunais.

OS OBJETIVOS

A referida proposta previu atenuar os constrangimentos atualmente existentes na jurisdição administrativa e fiscal, que a impedem, muitas vezes, de dirimir, num prazo razoável, os litígios que lhe são submetidos pelos cidadãos, pelas empresas e pelas entidades públicas.

A proposta tinha como principal objetivo otimizar o funcionamento e a capacidade de resposta dos tribunais administrativos e fiscais.

Visava também ajustar a distribuição de competências entre as várias instâncias, nomeadamente entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos, com o objetivo de salvaguardar que o Supremo Tribunal Administrativo apenas seja chamado a exercer quando surjam questões de direito que exijam ser apreciadas pelo órgão de cúpula da jurisdição.

Por outro lado, pretendia promover a especialização dos tribunais administrativos e fiscais, uma vez que as questões jurídicas com que se deparam são cada vez mais complexas, e convocam a aplicação de um quadro de princípios e normas muito específicos.

Nesta medida, a especialização prende-se com uma maior qualidade das decisões a ser proferidas pelos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.

Necessariamente uma maior especialização também obrigará a um maior leque de profissionais a exercer a magistratura, necessitando assim de serem abertas novas vagas.

Outra preocupação acautelada na referida proposta consistia na redução da litigância que surge relativa à interpretação e aplicação das normas de competências dos tribunais desta jurisdição.

A PROPOSTA DE ALTERAÇÃO AO ETAF

Na perspetiva de algum ajuste das competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos e Fiscais, a proposta previa que fossem inseridas alterações às normas contidas na alínea b) do artigo 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (‘ETAF’).

Por outro lado, quanto à maior especialização dos Tribunais, a proposta consagrava a criação de subseções especializadas nos Tribunais Centrais Administrativos e clarificava o âmbito da competência dos juízos administrativos sociais e dos juízos de contratos públicos ao nível da primeira instância.

Ainda visando o melhor funcionamento da jurisdição, a proposta habilitava o aumento dos quadros de juízes dos tribunais superiores, sempre que, em virtude de comissões de serviço, tais quadros se vejam desfalcados de juízes conselheiros ou de juízes desembargadores, assim se assegurando que o funcionamento daqueles tribunais não é prejudicado pela suspensão de funções dos magistrados nomeados em comissões de serviço.

Neste seguimento, a proposta ainda apresentava um alargamento do prazo de validade dos concursos de acesso ao cargo de juiz do Supremo Tribunal Administrativo e dos Tribunais Centrais Administrativos, de modo a permitir uma reflexão mais aprofundada no âmbito do processo de avaliação curricular dos candidatos a estes tribunais superiores.

AS ALTERAÇÕES AO CPPT E AO RGIT

Ademais, a proposta previa também que fossem inseridas alterações ao Código de Procedimento e de Processo Tributário (‘CPPT’) e ao Regime Geral das Infrações Tributárias (‘RGIT’), em relação ao ajuste das competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos e Fiscais.

AS ALTERAÇÕES AO DECRETO-LEI N.º 42/2001

Também no sentido de reduzir a litigância relativa à aplicação de normas de competência, a proposta previa a alteração ao Decreto-Lei n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, de forma a harmonizar o tribunal territorialmente competente em sede de contencioso apresentado em processo de execução fiscal por dívidas à segurança social com os preceitos legais previstos no Código de Procedimento e de Processo Tributário, prevenindo-se assim divergências de constitucionalidade material.

O SENTIDO E EXTENSÃO

Em face do exposto, a proposta foi agora aprovada, salientando-se as seguintes medidas:

  • Criar o Tribunal Central Administrativo Centro, com sede em Castelo Branco;
  • Restringir a competência para o julgamento, pela secção de contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo, dos recursos interpostos de decisões de mérito dos tribunais tributários, apenas à matéria de direito e quando o valor da causa seja superior à alçada dos tribunais centrais administrativos, contando que a sucumbência seja superior a metade da alçada do tribunal de que se recorre;
  • Criar as subseções administrativa comum, administrativa social e de contratos públicos e as subsecções tributária comum, de execução fiscal e de recursos contraordenacionais nos tribunais centrais administrativos, definir as respetivas competências, harmonizar as normas do ETAF em conformidade com esta nova organização, quanto à forma de substituição dos juízes e às medidas de gestão para acorrer a necessidades temporárias, distribuir entre o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e os presidentes dos tribunais centrais administrativos os poderes para fixar o número de vagas de cada subsecção e proceder ao seu preenchimento e definir as regras da sua instalação;
  • Alterar a competência territorial do tribunal tributário de 1.ª instância da área do domicílio ou sede do executado para a decisão dos incidentes, dos embargos, da oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, da graduação e da verificação de créditos e das reclamações dos atos materialmente administrativos praticados pelos órgãos de execução;
  • Redimensionar as competências dos juízes presidentes dos tribunais, atribuindo aos administradores judiciários as atividades que, pela sua natureza, lhes devam caber e revendo as responsabilidades relativas ao acompanhamento e avaliação dos resultados destes tribunais;
  • Possibilitar o aumento do quadro sempre que os juízes dos tribunais superiores sejam nomeados para cargos em comissão de serviços que não implicam a abertura de vaga no lugar de origem, extinguindo-se os lugares quando retomem o serviço efetivo, mantendo-se os juízes nomeados para lugares acrescidos além do quadro;

O ATUAL DECRETO-LEI N.º 31/2023

O Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de maio, no seguimento dessa Proposta de Lei n.º 75/XV/1, consagra a autonomia administrativa e financeira do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e define a organização dos seus serviços, com o objetivo claro que aumentar a capacidade de resposta da jurisdição administrativa e tributária.

A prossecução deste objetivo de otimização e eficiência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal exige, entre outras medidas, uma melhoria da gestão judiciária. Essa gestão cumpre ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), que detém competências em matéria de gestão e disciplina dos juízes, a gestão estratégica e a gestão processual, nos termos do disposto no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, e na Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, ambas na sua redação atual.

Até à data, o CSTAF tem funcionado na dependência dos meios que lhe são atribuídos pelo Supremo Tribunal Administrativo, o que dificulta o pleno exercício das suas competências, indispensáveis para uma gestão da jurisdição administrativa e fiscal mais eficiente e eficaz.

Para esse efeito, entendeu-se que é essencial a consagração da autonomia administrativa e financeira do CSTAF, e a definição da sua estrutura orgânica e regulação dos respetivos serviços, adequadas à natureza das suas atividades.

O Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de maio, entrará em vigor no próximo dia 1 de junho de 2023.

CONCLUSÕES

A proposta que foi apresentada poderá ter um alcance muito positivo para a eficácia e qualidade decisória da jurisdição administrativa e fiscal. Permitirá o aumento de vagas, e a maior especialização dos juízes, o que, expectavelmente originará decisões mais eficientes em face das matérias cada vez mais complexas.

Todavia, e para que tais efeitos se venham a concretizar na sua totalidade, deverá o Governo legislar nesse sentido, dado o prazo da autorização legislativa de 180 dias que ainda se encontra a correr.

Isto porque, na verdade, o Decreto-Lei n.º 31/2023, de 5 de maio, apenas delineou a autonomia administrativa e financeira do CSTAF e a organização dos seus serviços.

Por ora, estão longe de serem cumpridos os objetivos da proposta de lei, nomeadamente porque através dos elementos normativos publicados, ainda não se preveem as alterações elencadas na proposta, como por exemplo, a criação do Tribunal Central Administrativo Centro, com sede em Castelo Branco, com vista ao descongestionamento do Tribunal Central Administrativo Sul, entre todas as demais medidas objetivadas na proposta.

Algumas das medidas apresentadas na Proposta de Lei n.º 75/XV/1 já foram refletidas, ao longo dos anos, no Relatório do Grupo para o Estudo da Política Fiscal, de 3 de outubro de 2009, assim como no Relatório do Grupo de Trabalho para a Justiça Administrativa e Fiscal, de setembro de 2021 e no Relatório do Grupo de Trabalho para a Justiça Administrativa e Fiscal de fevereiro de 2022.

Pelo que, aguardamos, assim, que as medidas propostas venham finalmente a ser concretizadas e com vista a contribuir para uma melhoria no funcionamento da jurisdição administrativa e fiscal, pois a eficácia dos tribunais refletir-se-á no cumprimento das garantias dos contribuintes e no acesso à justiça.

***

Lisboa, 25 de maio de 2023

Rogério Fernandes Ferreira
Vânia Codeço
João Mário Costa
Rita Sousa
Carolina Mendes
Patrícia da Conceição Duarte
Álvaro Pinto Marques
Inês Reigoto

(Tax Litigation Team)

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