Newsletters

A obrigatoriedade de notificação do administrador de insolvência de liquidações da sociedade insolvente (o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo)

12 Junho 2025
A obrigatoriedade de notificação do administrador de insolvência de liquidações da sociedade insolvente  (o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo)
Newsletters

A obrigatoriedade de notificação do administrador de insolvência de liquidações da sociedade insolvente (o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo)

12 Junho 2025

O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo veio clarificar a obrigatoriedade da notificação do Administrador de Insolvência de dívidas da sociedade insolvente, não bastando o envio da respetiva liquidação para a caixa postal eletrónica da sociedade insolvente para que a dívida seja exigível.

ENQUADRAMENTO

No âmbito do processo n.º 01058/16.6BEAVR, de 6 de novembro de 2024, o Supremo Tribunal Administrativo foi chamado a decidir sobre se, no seguimento de declaração de insolvência, basta à Autoridade Tributária notificar a sociedade insolvente das liquidações, ou se deverá notificar igualmente o Administrador de Insolvência para que a dívida tributária seja exigível.

Recorde-se que o artigo 81.º, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pela Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, enuncia que o Administrador de Insolvência assume a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência.

De notar que ao abrigo do artigo 41.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), as pessoas coletivas e sociedades são citadas ou notificadas na sua caixa postal eletrónica ou na sua área reservada do Portal das Finanças, ou na pessoa de um dos seus administradores ou gerentes, na sua sede, na residência destes ou em qualquer lugar onde se encontrem. Pelo n.º 2 do mesmo artigo, não podendo efetuar-se na pessoa do representante por este não ser encontrado pelo funcionário, a citação ou notificação realiza-se na pessoa de qualquer trabalhador, capaz de transmitir os termos do ato, que se encontre no local onde normalmente funcione a administração da pessoa coletiva ou sociedade. Por fim, resulta do n.º 3 do artigo 41.º do CPPT que não esta disposição não se aplica se a pessoa coletiva ou sociedade que se encontrar em fase de liquidação ou falência, caso em que a diligência será efetuada na pessoa do liquidatário.

No caso em apreço, a sociedade insolvente foi notificada da liquidação de IRC e respetivos juros de mora na sua caixa postal eletrónica, através do sistema Via CTT, sem que tenha sido notificado o Administrador de Insolvência. No seguimento da instauração do processo de execução fiscal, a sociedade apresentou Oposição à Execução Fiscal, alegando a inexigibilidade da dívida, com base na ausência de notificação do Administrador de Insolvência.

O ENTENDIMENTO DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA

A Autoridade Tributária considerou que n.º 3 estatui que apenas o n.º 2 do artigo 41.º do CPPT não é aplicável às sociedades insolventes, não se pronunciando quanto à norma que resulta do n.º 1, 1.ª parte do artigo 41.º do CPPT, isto é, quando a notificação ou citação da sociedade é feita através da sua caixa postal eletrónica.

Assim, defendeu a Autoridade Tributária que quando a notificação é expedida para a caixa postal eletrónica da sociedade, não tem de ser concretizada em determinadas pessoas físicas à semelhança do que sucede com a notificação por via postal registada, por via postal registada com aviso de receção ou citação pessoal.

Desta forma, defendeu a Autoridade Tributária que, sendo obrigatório para os sujeitos passivos do IRC com sede ou direção efetiva em território português a ativação da caixa postal eletrónica, “(…) o legislador no que diz respeito à notificação ou citação da sociedade na sua caixa postal eletrónica, não exceciona à semelhança do que sucede quando a notificação tem de ser realizada em determinadas pessoas físicas, a notificação é feita à entidade a notificar, não sabemos quem acede à caixa postal eletrónica da sociedade.”.

Concluindo que, sendo a administração e gestão da massa insolvente transferida para o Administrador de Insolvência nos termos do n.º 4 do artigo 81.º do CIRE, incumbe-lhe o cumprimento de determinadas obrigações fiscais, designadamente, declarativas, não podendo desconhecer que a sociedade insolvente tem ativa uma caixa postal eletrónica, para a qual lhe são enviadas notificações efetuadas pela Autoridade Tributária.

O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

O Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de em apreço veio seguir o entendimento contrário ao da Autoridade Tributária, e esclareceu que sendo apenas notificada a sociedade insolvente e não o Administrador de Insolvência, procede a inexigibilidade da dívida.

Mais vem acrescentar o Tribunal que não há base legal para o dever de solicitar o acesso à caixa postal eletrónica da sociedade que a Autoridade Tributária impõe a cargo do administrador de insolvência, insolvente, pretendo valer-se da imprecisão da letra da lei – especificamente do n.º 3 do artigo 41.º do CPPT - para pôr em causa um princípio fundamental.

Conclui, ainda, o Supremo Tribunal Administrativo, que “a notificação dos atos em matéria tributária é uma garantia dos contribuintes, não um mero formalismo destituído de fundamento a que a lei obriga a AT para poder cobrar impostos. E é uma garantia dos contribuintes porquanto da notificação dos atos em matéria[s] tributária[s] depende o conhecimento dos por estes dos deveres a que estão vinculados perante a AT, permitindo-lhes cumpri-los atempadamente ou contra eles reagir, em caso de discordância com a sua existência ou conteúdo. Daí que seja manifestamente irrazoável pretender ter como notificada a sociedade insolvente da liquidação posterior à declaração de insolvência com base na mera remessa da notificação para a caixa postal eletrónica da sociedade (…)”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Supremo Tribunal Administrativo, através do Acórdão em apreço, veio manter a jurisprudência anterior quanto a este tema (em particular, os Acórdãos proferidos nos processos n.º 0871/19.7BEAVR e n.º 0261/19.1BELLE), e clarificar a necessidade de notificação do Administrador de Insolvência para assegurar a exigibilidade das dívidas tributárias.

Com esta decisão, o Supremo Tribunal Administrativo não só contribuiu para consolidar esta linha jurisprudencial, mas também fornecer uma orientação fundamental para os contribuintes que se encontram em situações semelhantes, assegurando uma interpretação mais garantística dos preceitos normativos nos casos de insolvência

***

Rogério Fernandes Ferreira
Vânia Codeço
Álvaro Pinto Marques
Mariana Baptista de Freitas
Bárbara Malheiro Ferreira
Maria Antónia Silva
Marta Arnaut Pombeiro
Marta Monteiro Moreira
Raquel Tomé Castelo

Know-How