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Ainda sobre a tributação em IMI das centrais eólicas e solares

23 May 2024
Ainda sobre a tributação em IMI das centrais eólicas e solares
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Ainda sobre a tributação em IMI das centrais eólicas e solares

23 May 2024

A problemática do enquadramento, para efeitos de IMI, das centrais eólicas e solares atingiu, nos últimos anos, (quase) o pódio do chamado “contencioso de massas”, continuando, ainda, a fazer correr tinta na comunicação social.

A DESORIENTAÇÃO DOS CONTRIBUINTES: A CIRCULAR N.º 8/2013, DE 4 DE OUTUBRO E AS RECENTES NOTÍCIAS DIVULGADAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL

A problemática do enquadramento, para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), das centrais eólicas e solares atingiu, nos últimos anos, quase o pódio do chamado “contencioso de massas”.

A comunicação social tem vindo a noticiar a existência de uma “nova vaga de ações judiciais”, motivada pela posição da Administração tributária a respeito da avaliação das “Torres Eólicas”.

Tudo começou com a orientação administrativa vertida na Circular n.º 8/2013, de 4 de outubro, segundo a qual cada aerogerador e cada subestação (componentes da realidade “Parque Eólico”) configuravam prédios urbanos do tipo – residual – “outros”, para efeitos de IMI, uma vez que, alegadamente, constituíam unidades independentes em termos funcionais.

Do que antecede decorreria:

  • A obrigação de inscrição matricial de cada aerogerador e de cada subestação integrantes de um determinado Parque Eólico;
  • A determinação do respetivo valor patrimonial tributário por recurso ao método do custo adicionado do valor do terreno (especificando-se que, no caso dos aerogeradores, eram objeto de avaliação a sapata de betão e a estrutura tubular metálica); e
  • Claro está, a sujeição a IMI de cada aerogerador e subestação.

Porém, do que antecede resultava também, na ótica dos contribuintes, uma oneração excessiva e desadequada dos parques eólicos.

A RESPOSTA DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

Pondo fim à controvérsia, o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) veio clarificar, no âmbito do Acórdão proferido no processo n.º 0140/15, datado de 13 de março 2017, que os aerogeradores e as subestações não podem, individualmente, ser considerados prédios urbanos para efeitos da sua tributação em IMI, na medida em que não constituem uma parte economicamente independente – do parque eólico como um todo – e não têm aptidão para, por si só, desenvolver uma atividade económica, isto é, não reúnem o elemento económico exigido pelas disposições relevantes.

Com efeito, entendeu esta jurisprudência que os elementos estruturais do conceito legal de prédio, para efeitos de IMI – isto é, os elementos físico, jurídico e económico – apenas se podiam ter por verificados por referência ao parque eólico (e central solar) como um todo, e não por referência aos aerogeradores (ou estruturas de suporte) individualmente considerados.

A NOVA ORIENTAÇÃO ADMINISTRATIVA: A CIRCULAR N.º 2/2021, DE 3 DE MARÇO

Procurando (supostamente) conformar os procedimentos da Administração tributária com a jurisprudência firmada pelo STA, foi revogada a aludida Circular n.º 8/2013, de 4 de outubro, e substituída pela Circular n.º 2/2021, de 3 de março.

Esta Circular veio clarificar os conceitos relevantes, determinando que, para efeitos de IMI, as centrais eólicas e as centrais solares, como um todo, são consideradas prédios urbanos do tipo “outros” e, por este efeito, sujeitas a avaliação por recurso ao método do custo adicionado do valor do terreno de implantação e a imposto.

Em particular, no que respeita à avaliação da central eólica, clarifica-se também que devem ser tidas em consideração as subestações, os edifícios de comando e as torres eólicas que compõem a central e, bem assim, os terrenos onde estejam implantadas, sendo certo que, no que respeita à torre eólica, deve apenas ser consideração a fundação (sapata em betão armado) e a torre, não sendo de considerar as pás, rotor e cabine.

Por seu turno, na avaliação da central solar, esclarece-se que são tidas em conta as subestações, os edifícios de comando e a estrutura que suporta os painéis ou coletores solares que compõem a central, bem como os terrenos onde estejam implantadas, sublinhando-se que, no que toca à estrutura de suporte, considera-se a sapata, os pilares/prumos fixos à fundação e a mesa, não sendo de considerar os painéis solares.

OS ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

O tratamento fiscal, em sede de IMI, das centrais eólicas e solares, tal como confirmado pelo STA, tem vindo a consolidar-se na jurisprudência dos tribunais superiores.

De facto, no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 13 de outubro de 2022, proferido no âmbito do processo n.º 451/15.6 BECTB, o Tribunal debruçou-se sobre a temática em apreço, entendendo que, para efeitos do conceito de “prédio”, o elemento económico se traduz na necessidade da fração de território em causa possuir, por si só, valor económico, distinto do valor das coisas (dos materiais que o compõem), o que não acontece com cada aerogerador integrante de um parque eólico.

A MAIS RECENTE JURISPRUDÊNCIA: A SENTENÇA DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE VISEU, DE 10 DE ABRIL DE 2024

Bem mais recentemente, por Sentença, datada de 10 de abril de 2024, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu debruçou-se sobre a questão da tributação, em sede de IMI, das torres eólicas, remetendo para a jurisprudência do já referido Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul.

Começa por lembrar o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que, não contendo o Código do IMI regras específicas sobre parques eólicos, o intérprete deve socorrer-se dos conceitos gerais da lei, seguindo as regras de hermenêutica jurídicas, o que implica que, para ser sujeita a imposto – para além dos elementos físico, jurídico –, uma determinada fração “tenha valor económico”.

E, remetendo para o decidido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul datado de 13 de outubro de 2022, proferido no âmbito do processo n.º 451/15.6 BECTB, afirma que “O elemento económico traduz-se na necessidade de a fração de território em causa possuir, por si só, valor económico, distinto do valor das coisas (dos materiais que o compõem), o que não acontece com cada aerogerador integrante de um parque eólico”.

Mais, alerta o Tribunal para o facto do Código do IMI não incidir, naturalmente, sobre equipamentos, sob pena de, como refere também, “resultados verdadeiramente caricatos”.

Conclui, assim, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que as torres eólicas, não possuindo valor económico por si, distinto do valor do parque eólico em que se integram e constituindo meros equipamentos de produção, não estão sujeitas a IMI.

CONCLUSÃO

Apesar da referida Circular 2/2021 ter clarificado o enquadramento tributário dos parques eólicos e das centrais solares, para efeitos de tributação em sede de IMI, certo é que este entendimento não se encontra totalmente em linha com a jurisprudência dos nossos tribunais superiores, não se conformando, pois, o setor das energias renováveis com a sujeição das torres eólicas a IMI.

De facto, não obstante essa tentativa de conformação das instruções administrativas com a jurisprudência dos tribunais superiores, os Tribunais continuam a ser chamados a decidir no sentido da não sujeição a IMI das torres eólicas, com o argumento de que as mesmas não possuem valor económico, por si, distinto do parque eólico em que as mesmas se integram, além de constituírem, naturalmente, meros instrumentos de produção.

Abre-se, pois, a possibilidade dos titulares de torres eólicas solicitarem o eventual reembolso do IMI pago nos últimos quatro anos quanto às torres eólicas, acionando os meios contenciosos ao seu dispor.

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Rogério Fernandes Ferreira
Vânia Codeço
José Pedro Barros
Álvaro Pinto Marques
Mariana Baptista de Freitas
Inês Braga Reigoto
Leonor Gargaté Oliveira
Bárbara Malheiro Ferreira
Alice Ferraz de Andrade
Raquel Tomé Castelo

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